domingo, 25 de dezembro de 2016

CONCEPÇÕES DE ALFABETIZAÇÃO: O QUE ENSINAR NO CICLO DE ALFABETIZAÇÃO

Pensar sobre o ensino e a aprendizagem da língua, pautado na reflexão da apropriação do Sistema Alfabético de Escrita, a partir da interação com diferentes textos escritos em situação de uso social seria inverossímil para um professor que foi inserido ao mundo das letras pela cartilha Caminho Suave, através de procedimentos que valorizavam a memorização, os textos prontos, a repetição, os exercícios de prontidão e de percepção, a produção de texto a vista de gravura, entre outros. No entanto, a partir da década de 1980, as concepções sobre o ensino da alfabetização foram abaladas pelas pesquisas realizadas por Emília Ferreiro e Ana Teberosky, sobre a Psicogênese da Língua Escrita e permitiu aos professores refletirem sobre o como a criança aprende e o que ela pensa e sabe sobre o uso da língua oral e escrita.
A pesquisa rompeu com a crença de que a inserção no mundo da leitura só poderia ocorrer após o domínio do sistema de escrita sendo este pré-requisito para o contato com textos de gêneros variados. Ainda, de acordo com as pesquisadoras o indivíduo no processo de alfabetização passa por fases distintas, ampliando a sua reflexão sobre o sistema de escrita até chegar ao domínio da norma ortográfica da língua escrita.
Intuitivamente, a criança sabe que através da fala e da escrita nós nos comunicamos. Anterior a sua entrada na escola, a criança já se envolveu com as práticas sociais de leitura e de escrita, por meio da interação social. Essa interação permite que a criança se aproprie de conhecimentos sobre os textos que circulam na sociedade e formule hipóteses sobre a língua escrita.
No processo de alfabetização é necessário considerar o uso e as funções da escrita com base no desenvolvimento de atividades significativas de leitura e de escrita. É importante que a escola vá além dos textos escolares e apresente ao aluno textos de diferentes gêneros e usos sociais que damos a eles.
Diante desse novo modelo de ensino da língua, a partir da década de 1990, surge o conceito de letramento que não veio substituir a alfabetização, mas completá-la.
Levar a criança a compreender e saber utilizar o sistema alfabético de escrita é função da alfabetização, que associada ao letramento ensina a ler e a escrever no contexto das práticas sociais da leitura e escrita, de modo que o indivíduo se torne simultaneamente alfabetizado e letrado, segundo Soares, 1998.
Apesar da nova concepção de alfabetização e letramento, segundo dados internacionais e nacionais, a escola não vem conseguindo cumprir a sua função quanto ao ensino da língua oral e escrita. Neste sentido, algumas ações têm sido implementadas com o objetivo de superar tais dificuldades, com destaque para: o ingresso da criança aos seis anos no Ensino Fundamental, que passou a ter 9 anos, a proposta de alfabetizar o aluno nos três primeiros anos do Ensino Fundamental (3º ano de escolarização, 8 anos de idade), a formação continuada em serviço, levando os docentes a estudarem as novas teorias sobre o ensino da língua e refletirem sobre sua prática pedagógica.
A resistência à nova concepção de ensino e aprendizagem da língua, após adentrar as escolas brasileiras, transformou-se atualmente numa grande discussão nacional, apoiada pela mídia, sobre quais concepções e metodologias são mais eficientes para alfabetizar e letrar. Essa reflexão permite levantar outro questionamento. Numa sociedade exigente como a atual, a escola também estaria cumprindo com a sua função se apenas ensinasse a codificar e a decodificar? Nossas crianças e jovens estariam inseridos num mundo globalizado em que a comunicação ocorre em tempo real?
Há controvérsias em relação às diferentes abordagens sobre o ensino da leitura e da escrita, porém não é possível desconsiderar as contribuições das pesquisas que colocaram o aprendiz como partícipe ativo da sua aprendizagem sendo o professor mediador do conhecimento.
Segundo Magda Soares, as dificuldades que enfrentamos hoje nessa fase de escolarização decorrem de interpretações errôneas ao transpor essa abordagem para a prática pedagógica de alfabetização, tais como: a faceta psicológica da alfabetização tirou a luz da faceta linguística; a divulgação de que o paradigma conceitual psicogenético não era compatível com a proposta de métodos de alfabetização e por fim a ideia de que convivendo com textos utilizados em práticas sociais a criança se alfabetizaria. A autora defende o trabalho específico de ensino do Sistema Alfabético de Escrita associado a práticas de letramento, ou seja, ensinar a aprender a ler e escrever e dar condições para saber exercer as práticas sociais que usam a escrita.
Pesquisas recentes, realizadas em Recife, com professores alfabetizadores, apontam para a possibilidade dos alunos se apropriarem do Sistema de Escrita Alfabética ao mesmo tempo em que ampliam suas experiências de letramento.
A apropriação da escrita alfabética e do uso da língua em práticas sociais vem ao encontro dos direitos de aprendizagem relacionados ao diferentes eixos da Língua Portuguesa que devem ser trabalhados ao longo dos três primeiros anos do Ensino Fundamental.
Não adianta o indivíduo saber codificar e decodificar o sistema alfabético se não faz uso dele no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, como também não adianta o indivíduo ser letrado se não faz uso autônomo do sistema de escrita.
Parafraseando Magda Soares, a escola cumprirá a sua função na alfabetização quando tornar o “individuo ao mesmo tempo alfabetizado e letrado”.
Fernanda Garcia Scrocchio Lourenção é docente do curso de Pedagogia da Unicastelo campus Descalvado


FONTE: http://unicastelo.br/portal/concepcoes-de-alfabetizacao-o-que-ensinar-no-ciclo-de-alfabetizacao/