02/out/2006
Adverte pais e gestores educacionais para a aplicação da
Lei 9.394, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que não reconhece
a alfabetização como nível ou subnível de ensino, ficando, assim, proíbida a
reprovação na alfabetização.
Uma criança, em sala de alfabetização,
não deve nem pode ser reprovada. Direi de outra maneira: a alfabetização não
tem caráter avaliativo, com fim de promover o aluno de um nível de ensino para
outro.
O presente artigo prova, através da
legislação educacional, que a sala de alfabetização não é reconhecida pela Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) nem tem, por isso mesmo,
caráter reprovativo. Nenhum aluno, matriculado, em sala de alfabetização, em
escolas públicas ou privadas, municipais, estaduais ou federais, pode ficar
retido em sala de alfabetização,ou pode ser rotulado de “reprovado”, mesmo que
a escola considere que criança não está alfabetizada em leitura.
A Lei 9.394, a LDB, promulgada em 20 de
dezembro de 1996, não reconheceu a sala de alfabetização como nível ou subnível
de ensino. Pelo artigo 21, da referida Lei, a educação escolar compõe-se de:
(1) educação básica, formada pela educação infantil ensino fundamental e ensino
médio e (2) educação superior.
O que se pode observar pelo artigo 21 é
que a Lei não faz qualquer referência à alfabetização. No artigo 29, a LDB, sim,
refere-se à Educação Infantil entendida como primeira etapa da educação básica
cuja finalidade precípua é “o desenvolvimento integral da criança até seis anos
de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social,
complementando a ação da família e da comunidade”.
Durante muito tempo instituições
privadas de ensino entenderam que a classe de alfabetização poderia ser
considerada um subnível da educação infantil. Ou, talvez, uma fase
intermediária e imprescindível entre a educação infantil, especialmente a
pré-escola e o ingresso na primeira série do ensino fundamental. Uma concepção
com boas intenções, mas com uma origem equivocada ou falaciosa: o ensino
fundamental, no seu primeiro ciclo, é exatamente para dar início ao processo de
alfabetização. Veja que utilizei a palavra processo para dizer que durante toda
a fase da educação básica o aluno, ao certo, está sendo “alfabetizado” em
leitura, escrita, ortografia, informática, e assim adiante.
A educação infantil não acolhe a sala
de alfabetização. No artigo 30, a lei diz que a educação infantil será
oferecida em: (1) creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três
anos de idade e (2) II - pré-escolas, para as crianças de quatro a seis anos de
idade. Na verdade, hoje, com a Lei nº. 11.274, de 2006, a rigor, a educação
infantil só vai até os cinco anos.
E por que existe sala de alfabetização
no Ceará? Ora, por pura tradição e predomínio de uma pedagogia de época que via
na alfabetização uma fase preparatória para o ingresso da criança no Ensino
Fundamental, etapa que os professores já esperavam, também, o domínio
rudimentar em leitura, escrita e cálculo por parte dos alunos.
Durante muito tempo, a pedagogia de
alfabetização do bê-á-bá também favoreceu o surgimento de sala de alfabetização
não só no Ceará como em muitos estados da Federação, especialmente os da Região
Nordeste. Por alfabetização, se entendia e se entende, em muitas escolas, a
prática de ensino da primeiras letras. É o que os teóricos de leitura chamam de
decodificação, onde o principal papel da escola é ensinar a criança a
reconhecer as letras, nomeá-las e de forma não muito sistemática a relação
letra-fonema, para o início da leitura mecânica. Aqui, vale dizer que não se
cogita ou se cogitava o ensino da leitura com sentido, isto é, ler o texto para
atribuir-lhes sentidos.
Em outros casos, o pensamento ou
metodologia de muitos alfabetizadores, favorecidos, quase sempre, pelas
cartilhas de alfabetização, do abecê, concebia (m) a alfabetização como a
iniciação no uso do sistema ortográfico. Ora, esta concepção é descartada,
hoje, é ampliada e vista como processo de aquisição dos códigos alfabético e
numérico ou, em outras palavras, como o uso social da língua verbal e
não-verbal, o chamado letramento que deve ser trabalhado, principalmente, na
primeira série do ensino fundamental e enfatizada até a quarta-série do mesmo
nível de ensino. É aqui que se ensina, realmente, a língua e o sentido que
permeia as habilidades lingüísticas como leitura, escrita e ortografia e os números.
Na etapa anterior, a da educação infantil, o que se pode fazer é uma educação
lingüística, enfatizando, em sala, a linguagem e suas funções, mas sem qualquer
conotação ou apelo metalingüístico ( por exemplo, estudo das vogais, das
consoantes, das semivogais, das sílabas, dos ditongos etc)
Agora, tanto na educação infantil como
ainda nas remanescentes salas de alfabetização (no Rio Grande Sul, por exemplo,
não existem mais salas de alfabetização) não têm caráter de promoção, isto é,
não é pré-requisito para que a criança entre no ensino fundamental. O pai ou
responsável pode, inclusive, queimar esta etapa e matricular a criança
diretamente no ensino fundamental. Claro, o maior prejuízo, nesse caso, é a
perda da socialização uma vez que se aprende bem a língua materna em interação,
na relação interpessoal e em vida social. Na educação infantil, pode a escola,
desde cedo firmar as bases do aprender a ser, a conviver, a conhecer e a fazer,
pilares da educação universal, segundo a UNESCO. Mas isso é uma alfabetização
para a vida, para um olhar novo sobre o mundo, como quis a pedagogia
paulofreiriana.
O artigo 31, da LDB, diz, textualmente
e reafirma o que dissemos anteriormente, que na educação infantil a avaliação
far-se-á mediante acompanhamento e registro do seu desenvolvimento, sem o
objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental. O quer dizer
que os pais ou responsáveis podem, repito, não matricular seus filhos nesta
etapa e, aos seis anos, podem matricular a criança diretamente no ano inicial
do ensino fundamental, mesmo sem “ ser alfabetizado”. Por quê? Porque o ensino
fundamental, especialmente no seu primeiro ciclo, é exatamente o período para a
alfabetização em lectoescrita.
Mais recentemente o artigo 32, da LDB,
foi modificado pela Lei nº. 11.274, de 2006. A lei determinou que o ensino
fundamental obrigatório passou a ficar com duração de 9 (nove) anos, gratuito
na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, e tendo, por
objetivo, a formação básica do cidadão.
(1) - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o
pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo;
(2) - a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da
tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade;
(3) - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a
aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores.
O item 3 do artigo 32, da LDB, como
podemos observar, se constitui, assim, um momento de alfabetização no ensino
fundamental onde a criança vai desenvolver a competência de aprender através do
domínio da leitura, da escrita e do cálculo.
Diria que nesta fase de ingresso da
criança, aos seis anos, no ensino fundamental deve ser prioritariamente
dedicado ao “o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de
solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida
social”, conforme acentua o inciso IV do artigo 32, da LDB
Vale salientar que o artigo 6º da LDB,
modificado pela Lei nº. 11.274, de 2006 estabelece, de forma compulsória, o
dever dos pais ou responsáveis de efetuar a matrícula dos menores, a partir dos
seis anos de idade, no ensino fundamental.
Uma outra novidade que deve ser
considerada por gestores educacionais, pais ou responsáveis e educadores é que
o artigo 32 da LDB sofreu, pela Lei 11.274, a seguinte modificação em sua
redação: o ensino fundamental obrigatório passou duração de 9 (nove) anos,
gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade e terá por
objetivo a formação básica do cidadão.
Uma palavra final: não permita que se
filho ou filha seja retido (a) em sala de alfabetização. A existência de sala
de alfabetização revela hoje o quanto a escola está na contramão da LDB e dos
demais estados que têm experiência exitosa em alfabetização, como os da Região
e Sudeste do País. Em caso de resistência da escola, procure esclarecimento
junto ao Conselho Estadual de Educação ou evoque à LDB através da promotoria
pública.
FONTE: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2921/A-Lei-9394-96-proibe-a-reprovacao-em-sala-de-alfabetizacao