terça-feira, 9 de janeiro de 2018

PROFESSOR DEVE SE TORNAR FACILITADOR DO APRENDIZADO, DIZ CRIADOR DE MÉTODO INOVADOR

Para Jonathan Bergmann, a sala de aula invertida permite um tratamento mais individual de cada aluno

Menos exposição de conteúdo, mais atendimento um a um e ajuda na resolução de problemas que os alunos apresentam. Jonathan Bergmann, professor de Química na Universidade do Colorado (EUA), defende que essa seria a melhor forma de engajar os estudantes e aproveitar o tempo em classe. Foi essa a base da sala de aula invertida, método criado por ele e seu colega Aaron Sams em 2007, quando ambos lecionavam Ciências em uma escola de Ensino Médio.
O norte-americano propõe que a apresentação de conteúdo ocorra em casa, com os alunos recebendo vídeos, textos, áudios ou games que abordam a matéria da próxima aula. Em sala, eles precisam realizar atividades em cima do que aprenderam, e os professores fazem a orientação em cima de cada dúvida ou dificuldade apresentada pelos estudantes. “O foco não é mais a entrega de conteúdo ou a disseminação do conhecimento, mas fazer do professor um facilitador da aprendizagem”, comentou em entrevista a NOVA ESCOLA.
Bergmann é o principal convidado da primeira edição do FlipCon Brasil, congresso internacional sobre sala de aula invertida (“Flipped Classroom” em inglês). O evento será realizado pela GEN Educação e pelo Universia Brasil em 31 de agosto, em São Paulo.
Existe alguma relação entre a sala de aula invertida e os pensadores clássicos da Educação, como Jean Piaget e Lev Vygotsky?
Tanto o Piaget quanto o Vygotsky apoiaram o modelo construtivista, e a sala de aula invertida é sobre criar um espaço de aprendizagem mais ativo durante o período de aula. Além disso, Vygotsky adicionou o componente de um mentor em seu modelo. Uma vez que a sala de aula invertida dá muito mais tempo para o aluno estar frente a frente com os professores, ela enfatiza o papel do mentor.
Como a proposta da sala de aula invertida rompe com a lógica do ensino transmissivo?
Ainda há ensino transmissivo na sala de aula invertida. A diferença é que o lugar onde a transmissão ocorre não é com o professor durante o espaço em grupo, o período de aula. Isso acontece no espaço individual, no qual o aluno tem controle do ritmo de aprendizado. Isso altera drasticamente o espaço em grupo. O tempo de aula se transforma em um rico momento de aprendizagem, exploração, prática e engajamento.
Qual a relação entre o modelo e a aprendizagem baseada em problemas?
O ponto principal da sala de aula invertida 3.0 é que ela é a metaestratégia que suporta todos os outros modelos de ensino. Inverter a sala de aula forneceu a inúmeros professores e escolas mais tempo para utilizar a aprendizagem baseada em problemas.
Como incentivar que os alunos tenham uma postura investigativa?
É muito importante que os estudantes “comprem” a proposta da sala de aula invertida. Esta é uma das principais características do nosso programa de Certificação da Sala de Aula Invertida. Muitos estudantes se acostumaram a um estilo de aprendizagem mais passivo. Para muitos, a sala de aula invertida gera muito trabalho, pois eles precisam desempenhar um papel mais ativo na aprendizagem. Embora difícil para esses alunos, é a melhor coisa para eles.
Em um mundo atual, você acredita que o professor esteja perdendo seu protagonismo no ensino?
Os professores são ainda mais importantes em uma classe com sala de aula invertida, pois ela muda a dinâmica da sala de aula. O foco não é mais a entrega de conteúdo ou a disseminação do conhecimento, mas fazer do professor um facilitador da aprendizagem, trabalhando com alunos em pequenos grupos e tendo mais interações um a um. Os alunos recebem exatamente o que precisam, quando precisam.
Em seu livro, publicado em 2012, você traz resultados que mostram uma melhoria no rendimento dos alunos, mas ressalva que não eram estudos de rigor científico. De lá para cá, quanto a pesquisa sobre sala invertida avançou?
Desde que escrevi esse livro, 100 artigos científicos foram escritos sobre o tema. Os resultados mostram que a sala de aula invertida é uma estratégia poderosa que ajuda os estudantes.
Aqui no Brasil, muitos professores reclamam que não têm tempo para preparar as aulas. A sala invertida não demandaria mais tempo extraclasse ainda?
Sim, a sala de aula invertida demanda mais tempo. Eu encorajaria o Ministério da Educação, os líderes das escolas e os diretores dos colégios a criar esse tempo. Se eles querem realmente mudar suas escolas, adotar a sala de aula invertida será o melhor uso do tempo.
Como avaliar uma aula realizada em sala invertida?
A sala de aula invertida muda o sistema de avaliação. Há uns anos, conversei com Greg Green, diretor da primeira escola totalmente invertida do mundo, a Clintondale High School [localizada em Clinton, Estados Unidos]. Ele me disse que 80% do tempo de aula eram centrados no professor e 20% no aluno. Depois que a escola tinha invertido a sala de aula, os números viraram. Agora, apenas 20% do tempo de aula é centrado no professor e 80% é centrado no aluno. À medida que uma escola expande o aprendizado, é imperativo que os sistemas de avaliação sejam redesenhados. O avaliador tem de assistir o mesmo vídeo que os alunos viram, verificar se as atividades de classe correspondiam à lição, como são as interações entre professor e alunos e entre alunos em sala e saber que, nesse modelo, as aulas são mais barulhentas e agitadas.